segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Maria Do Pé Atrás

Meu nome já era Maria, bem antes de eu nascer. Eu não sei o por quê do nome, mas sei que gosto. Bem antes de eu nascer a minha mãe já sabia que um dia ela teria sua própria Maria. Sim, por que Maria nascia de penca naquela época em que as ocupações não ocupavam tanto as pessoas.
Então ela decidiu se mudar do vilarejo onde ela morava, com medo de eu ser só mais uma Maria neste mundão de Deus. Foi para as terras do Pé Atrás, onde as pessoas se olhavam torto, espertas, atentas a qualquer fato que não lhes passasse boa fé.
Então, depois de nascer eu virei: Maria do Pé Atrás.
Os anos foram passando e eu fui percebendo que mais dia menos dia os meus “pés atrás” iam querer tomar outros rumos na vida e quando este dia chegou eu senti um aperto tomar conta do peito, destes que diz que a gente deve ir embora para conhecer as outras coisas que a vida reserva pra gente.
Fui seguindo meu caminho e quanto mais eu andava, mais ia percebendo que o mundo não era mundo de verdade.
A minha terra não era mais terra não, as pessoas não eram mais pessoas não. Até os bichos não eram mais bichos. Depois que levaram pra lá uma tal de desilusão, as pessoas pararam de sonhar.
Você já viu o olhar de quem não sonha?
É assim, parecido com esse seu, sem brilho, perdido, dissimulado feito olhos daquele que trai.
A gente da minha terra deixou de ser gente quando essa desilusão se espalhou e um clarão de cegar tomou conta de tudo. As pessoas rasgaram sem dó o peito e arrancaram de lá seus sonhos mais íntimos. Dizem que foi o juízo que explodiu de vez...
Eu não vi o clarão. Nunca tive juízo mesmo!
Quando, a jorro de sangue, os sonhos eram jogado pra fora, do peito pro asfalto, eu me dedicava a recolher um por um e guardar dentro de mim. Depois disso eu não confiei mais naquelas pessoas, eu não confio mais nem na minha própria sombra. Como confiar em quem arma emboscada para o próprio sonho?
Maria do Pé Atrás queria cada vez mais ficar para trás de tudo aquilo e foi por isso que passei a manter meus olhos bem abertos, dia e noite, sem sossego, sem descanso.
Eu não quis ficar mais lá, eu não quis ver o fim de tudo. Eu não quero mais ser azucrinada pelo olhar vazio. Falta de sonho faz mal. E mal a gente corta pela raíz.
Mas este seu olhar perdido me chamou a atenção... Eu reconheço de longe. Você não tem sonho, tem?
Vê meus olhos? Parecem cansados pelas noites mal dormidas enquanto me vigiam dia e noite daquelas pessoas, mas estão cheio dos sonhos que recolhi e os seus tão vazios. Mas eu posso te ajudar. Eu posso te vender um sonho.
Mas eles custarão os olhos da cara. Os olhos da sua cara!
Em troca deste sonho que tanto te faz falta eu vou querer estes seus velhos olhos de águia, que enxergam além do que se pode ver, mas que perderam a capacidade de brilhar. Com este sonho você terá flores, entradas triunfais, seu nome gritado, aclamado.
É uma oportunidade que não aparece todo dia. É uma troca justa...
Afinal, falta de sonho faz mal, não faz? E mal a gente corta pela raíz!
Thais Foresto (2010)